Esse é um assunto sobre o qual eu queria falar faz tempo. Há mais de 10 anos dando curso de escalada, no começo eu observava e não entendia, mas nos últimos anos ficou bem claro pra mim: Algumas pessoas fazem o Curso de Escalada pra ter seu primeiro contato com escalada, e isso é ótimo. Mas muitas delas acabam tendo o curso como seu primeiro e único contato com a Escalada. Então eu me peguei levantando o seguinte questionamento para mim mesmo: Não teria sido mais divertido e proveitoso se essa(s) pessoa(s) tivesse satisfeito seu ímpeto com um dia de Escalada “tutoriada”? Ou seja, com um guia, na rocha, pra ela fazer de fato o que ela tinha interesse desde o começo, que era Escalar?
Não que durante um curso de Escalada não se escale, mas o foco é mais na confecção dos nós, nos procedimentos de segurança, nas várias etapas sucessivas para se executar algumas tarefas (como limpar uma via). É complicado julgar e tenho feito esse exercício de não colocar considerações sobre as escolhas das pessoas em todos os campos existenciais: Pessoal, profissional, esportivo, alimentar, etc… Eu sei que é dificil mas acredito que cada um tem capacidade de tomar todas as suas decisões por conta própria, e mesmo que não tenha, é válida a tentativa e inestimável o aprendizado. Por isso, contradizendo a tendência há alunos que tiveram seu primeiro contato com a escalada durante o curso, e hoje estão me matando de orgulho com “altas fotos de escalada” no instagram toda semana. Mas é fato que os escaladores que já tinham tido algum contato com a escalada previamente e já chegaram no curso focados em porquê aprender a “armar uma parada equalizada” ou entendendo porquê estar em “dois pontos na hora de limpar uma via” mantiveram uma constância na escalada até hoje e proporcionalmente são infinitamente mais numerosos que o pessoal que “caiu de paraquedas” no curso. Como se o pessoal que nunca tinha tido nenhum contato com escalada saísse do curso se perguntando: “E agora, o que é que eu vou fazer com tudo isso que eu acho que aprendi?”
A verdade é que não é necessário chegar sabendo nada, o curso é bem didático e pedagógico, mas quando as pessoas chegam conhecendo a dinâmica de uma escalada, isso já facilita de sobremaneira o processo educativo. Quando a pessoa chega decidida: “Quero me tornar um(a) escalador(a).” Pronto, o escalador já está criado, e só precisamos aparar umas arestas e deixar que ele absorva o conhecimento durante o curso por conta própria e organize as idéias na sua cabeça da maneira que lhe convém, independente se ela já teve algum contato com escalada antes ou se era uma pessoa sedentária que “ouviu o chamado da escalada” de uma hora pra outra rsrs. Mas quando a pessoa chega pra fazer um curso de escalada sem saber como funciona essa dinâmica de fazer segurança um para o outro, que existe um equipamento que a gente chama de freio, que tem que limpar (e o que é) a via no final da escalada, então eu pude observar nos últimos anos que a probabilidade dessa pessoa se dispersar e não seguir escalando é maior.
Eu não quero com isso desencorajar ninguém a fazer um curso de escalada, isso seria no mínimo uma loucura, ainda mais que os cursos são uma das coisas das quais eu dependo pra sobreviver e fortuitamente também uma das que eu mais gosto de fazer. Na verdade eu procuro me divertir durante o curso, como se fosse um dia descontraído com meus amigos, tento me conectar com meus “alunos”, para tentar entender melhor suas percepções, empatizar e tornar o ambiente mais leve e a verdade é que eu me divirto, espero que tanto quanto quem faz o curso! Mas eu gostaria de compartilhar essas experiências e levantar essa reflexão, que acredito possa ser bastante construtiva e positiva para todos que estejam buscando esse primeiro contato com a escalada.
Então vem outra questão: Eu quero começar a escalar, e não conheço ninguém que escala: “Como faz?”
Digo isso pois imagino que deve ser bastante frustrante você chegar pra fazer um curso de escalada esperando muita *escalada*, muitas vezes vai ser o primeiro contato com o esporte e em vez disso vem aquela avalanche de informações, técnicas e procedimentos que você nem sabe direito pra que serve. Eu tenho medo que isso possa ser um dos fatores que fazem com que essa pessoa desencane do esporte. Enquanto que eu tenho visto numa cidade aqui do lado surgirem muitos escaladores todos os meses porque foram levados pra rocha por seus amigos pra escalar, subir pedra (e djorzar B-) ). Subir pedra que é o gostoso, o legal da brincadeira, na minha opinião. Depois, vem aquele ímpeto de querer poder fazer isso por conta própria, e só depois acredito que brote a sementinha de querer se especializar, fazer um curso e evoluir no esporte tanto física quanto tecnicamente que foi plantada naquele dia que a pessoa fez sua primeira escalada, seja com os brothers, seja com um profissional qualificado.
Quando eu comecei nesse “ramo”, mais de 15 anos atrás, antes de escalar eu era guia de Rafting (Boom, essa ninguém sabia!) e logo depois cheguei a fazer alguns trampos de levar alguns grupos pra fazer Cume do Cuscuzeiro e Rapel pelas agências locais (que exploravam a gente descaradamente). Mas foi só a partir de 2012 que, devido à crescente demanda, que comecei a exercer a função de “Guia de Escalada de verdade” aqui no Cuscuzeiro mesmo. E de lá pra cá tive experiências muito gratificantes com clientes de vários perfis em escaladas guiadas de um ou dois dias.
Foram pessoas que já escalavam, algumas tinham parado e queriam voltar depois de anos com a “supervisão de um adulto”, outras eram pessoas que nunca tinham tido contato nenhum e depois voltaram pra fazer o curso e depois voltaram de novo pra fazer uma escalada guiada tutoriada. Teve gente que nunca mais voltou, teve aqueles que nunca mais pararam, e teve um que me chamou bastante atenção: Ele tinha acabado de fazer um curso com um “bambambam” da escalada, pagado caro, e queria que eu apresentasse o Cuscuzeiro pra ele. Claro, pois não!
Qual não foi minha surpresa em saber que não tinham ensinado a ele nem o básico. Passamos um final de semana incrível escalando, e eu ensinando a ele na prática finalmente o que era uma parada equalizada, como fazer um rapel autossegurado, como usar o grigri e encorajando-o a repetir tudo lá em cima comigo ao seu lado. Aquela “Vivência de Escalada em Rocha” virou um curso prático e ele saiu daqui muito mais autônomo, e já até vieram elogiar sua conduta com relação à segurança posteriormente. Eu contextualizei esse caso pois foi um caso em que a pessoa fez o curso como primeiro contato com escalada, e já saiu escalando por aí, não para mais. É o outro lado da moeda, e também mostra algumas das vantagens de se ir pra rocha com um escalador mais experiente. Não gosto de oferecer um pacote fechado e fixo. Como eu conheço bem o local, procuro sempre adaptar a atividade de acordo com o sol (pra ficar o máximo possível de tempo na sombra e não tostar), com o nível do cliente e as suas pretensões. Tem gente que vem só pra fazer a Visual porquê ela aparece no Livro “As 50 vias Clássicas do Brasil” do Flávio Daflon. Tem gente que quer fazer cume, tirar selfie e ir pra cachoeira depois. E tem gente que quer fazer cume, depois quer fazer esportiva, depois quer fazer a visual e ainda quer que eu ensine o encordamento e como dar seg. E por mim tudo bem!
Ta tudo ótimo, eu não estou aqui pra julgar ninguém, estou à disposição de quem quiser contratar meus serviços, e vou fazê-los com a maior satisfação de quem não vai passar um dia no escritório. Afinal de contas: “Estamos aqui pra isso” rsrs. Uma das partes mais gratificantes da profissão é poder compartilhar o conhecimento e ajudar as pessoas a realizar seus sonhos! É tipo esquema de pirâmide kkkkkkk Quando uma pessoa realiza um sonho eu ganho 15% de felicidade sobre o sonho realizado, quando ela leva alguém pra realizar o sonho eu ganho 5%, e por aí vai.
É a tal relação ganha-ganha. Então quando você contrata este tipo de serviço, você está pagando por conveniência, está cortando caminho pra ir direto ao seu objetivo, sem ter que “passar perrengue”, ficar procurando, passar veneno, está eliminando algumas incertezas para que sobrem somente algumas e você consiga lidar com elas, enfrenta-las e superá-las. Afinal de contas, eu posso até guiar, mas você tem que escalar por conta própria! Será que você consegue?
Bem, no final das contas, a discussão entre fazer um curso de escalada ou uma vivência de escalada na rocha não tem uma conclusão óbvia. Mas acredito que não é todo mundo que sabe que existe a segunda opção, e que há profissionais qualificados em vários lugares do Brasil pra levar pessoas que querem ter esse primeiro contato pra escalar na rocha. Muitos são amigos meus e se você precisar contratar algum pode me mandar mensagem que eu indico!
E fica o toque para o pessoal que já escala! Já levaram um brodinho pra escalar pela primeira vez?! Kamon, é divertido fazer essa funça e mais gente, mais zueira, mais diversão = mais escalada! Afinal, escalada é nosso objetivo, mas ninguém fica 6 horas na falésia escalando, tem que ta junto com uns brother/sista firmeza good vibes nos pé de via, né? Ah! Mas não se esqueça: antes de levar seu pupil@, tenha uma conversa sobre ética, mínimo impacto, lixo, barulho e comportamento na escalada, seu pupilo é sua responsabilidade! Então, escaladores, vamos recrutar os candidatos! E não esqueça de orientá-los para que façam um curso de escalada depois que eles tiverem tomado gosto pela coisa!